Justificando um dos motivos que nos fez retornar à Cusco depois de nossa primeira viagem ao Peru, link aqui Peru – conhecer a linda Laguna Huamantay – eu e a Lu acordamos quando a noite ainda estava fechada, tudo escuro lá fora, 4 horas da madrugada, e nós tateando nossas coisas dentro do dormitório coletivo do hostel Pariwana.
Arrumamos nossa mochila para o dia, com protetor solar, folhas de coca, água, com o lanche que o pessoal do hostel gentilmente providenciou para nós, eis que ainda era muito cedo para servirem o desayuno, e aguardamos a condução na recepção.
Quando o guia chegou para nos buscar nos juntamos ao grupo já formado e seguimos de van pelas estradas, rumo às montanhas que circundam Cusco. O trajeto todo de van de Cusco até o pé da montanha durou cerca de 3 horas. Com 2 horas de viagem paramos para o café da manhã ( já incluso no pacote do tour) e depois seguimos mais 1 hora até a montanha. Na volta, paramos no mesmo ponto que tomamos o café da manhã para almoçar. Chegamos na base da montanha por volta das 9 horas da manhã.


Do ponto até onde o veículo nos deixou, munidos de cajados (eu com meus inseparáveis bastões de caminhada, companheiros desde o Caminho de Santiago), caminhamos por mais um trajeto de cerca de um quilômetro. Seguimos devagar, mas meu peito já arfava em busca de ar. Na entrada, onde inicia a trilha propriamente dita, há um posto de controle da comunidade, onde pagamos uma taxa de 10 soles.

Nosso guia nos contou que quando ele era pequeno, a montanha tinha muito mais neve no pico que ela tem hoje. Inclusive, foi nos mostrando durante o caminho pedaços da montanha que já foram cobertos por neve e hoje não são mais. De acordo com ele, foram feitos alguns estudos climáticos na região e a previsão dos especialistas é que a montanha Salkantay tenha mais 50 anos com neve apenas. Depois deste tempo, será uma montanha normal devido ao aquecimento global.
A Laguna Humantay é uma lagoa maravilhosa nos pés da montanha Salkantay, localizada a 4.630 metros de altitude. Haja coração e pulmão! A montanha tem 6.200 metros de altura e o caminho para a lagoa garante um visual de tirar o fôlego, cinematográfico. A água é cristalina e super gelada, já que a lagoa é “abastecida” com o degelo da montanha. O tom azulado/esverdeado – dependendo da luz que incide na água da Humantay deixa qualquer um impressionado com a sua beleza.
Quando chegamos no início da trilha foi necessário uma decisão: seguir a pé ou pagar 60 soles para os moradores da comunidade local, para subir no lombo de mulas? Confesso que para mim foi uma decisão difícil. Não me agradava em nada a ideia de usar os bichinhos, explorar sua força, mas no estado em que eu me encontrava depois de tantos dias de viagem, tantos trekkings pelas montanhas de Huaraz, eu já duvidava de minhas condições físicas pra enfrentar a longa trilha íngreme, sempre ascendente, que já se avistava de onde estávamos.

A Lu já chegou decidida a pagar pela carona em uma das mulas, ciente de que não teria condições de fazer a trilha caminhando. Cedi aos apelos do meu corpo ( creio que mais até do psicológico, já abalado pela visão da montanha a minha frente…), paguei e subi em uma das mulas. Com os olhos marejados, à contragosto.

Quanto mais o animal avançava mais eu me conscientizava que seria muitíssimo sofrido, penoso, subir a pé. Realmente, o treeking pela trilha pedregosa e bastante inclinada é um teste físico e tanto para os viajantes. Enfim, depois de 30 minutos de subida já comecei a avistar o pico nevado da Salkantay, que vai dando as caras por trás das pedras, até que de repente… as águas cristalinas da Humantay. Foi um momento de bastante alívio e alegria! Inesquecível!
Tivemos cerca de uma hora pra ficar na Laguna antes de começar a descida. Usei essa tempo pra ficar admirando aquela belezura toda, fiz minhas preces, expressei minha gratidão a Deus, ao Universo, à Pachamama, por permitirem eu ter chegado até ali, e ver aquela maravilha com meus próprios olhos. E claro, fiz muuiitaaas fotinhos, de vários ângulos, encantada com a paisagem.
O guia Anderson, profissional diferenciado, chamou todo o grupo para um cantinho da Laguna, onde fez uma explanação sobre o lugar, sobre as Apus – as montanhas sagradas dos incas ( a Salkantay é uma delas) – sobre a cultura do povo peruano, dos seus ancestrais. E coroou nosso momento, nosso dia, nossa estada no Peru, tocando flauta andina, um tributo à Pachamama, a Mãe Terra. Enquanto ele tocava, se instalou um silêncio coletivo, imperando o som da flauta e a visão da Laguna e da Montanha. As palavras não dão conta de expressar meu sentimento, minha emoção naquele momento. Lágrimas de Gratidão rolaram na minha face.
Como disse o guia Anderson: “As melhores fotos, as melhores lembranças, ficam no coração”. ♥
Sobre as Apus: na mitologia Inca, apu era o nome dado aos poderosos espíritos da montanha. Os incas também usavam apu para se referir às próprias montanhas sagradas. Cada montanha tinha seu próprio espírito, com o espírito indo pelo nome de seu domínio de montanha.
Los Apus, montanhas sagradas dos Andes, são como anjos. Uma vez que se aproxime delas, não deixarão de te proteger. Assim me senti próximo à Salkantay: protegida e abençoada.
Encerrado nosso tempo lá encima, começamos a descer pela trilha, por cerca de 45 minutos. A descida também não é das mais fáceis. É preciso ter cuidado para não escorregar e descer rolando até o acampamento. Isso força bastante o joelho. O caminho de terra também era um pouco escorregadio. Mas enfim, chegamos na base, e caminhamos até onde nos aguardava o transporte.
Nos dirigimos então para o paradouro nas montanhas a fim de almoçarmos no mesmo lugar onde tomamos nosso desayuno. Comida típica peruana, muito gostosa. Tivemos ainda um tempo para descansar, com a visão das montanhas ao redor, muito bonito. Chegamos de volta em Cusco por volta das 19 horas. Peruas cansadas mas realizadas com o passeio.

Eu e a Lu resolvemos preparar nosso jantar, um macarrão na cozinha coletiva do hostel e ficamos por ali mesmo, descansando. Afinal, teríamos mais um passeio no dia seguinte, para o qual também teríamos que acordar novamente no meio da madrugada.
Ficamos jogadas pelos sofás do hostel e fomos dormir cedo, absorvendo tantas sensações que só o Peru nos deu de presente. E as Apus.
Outros links de narrativas sobre essa viagem:
Laguna Llanganuco ou Chinancocha – Huaraz – Peru
Adiós, Huaraz! Hola, Trujillo! – Peru
As riquezas da Região Norte do Peru – Peru
Volvendo el ombligo del mundo – Cusco – Peru
No próximo post… Vinicunca ou Winikunka, também chamada de Montaña de Siete Colores, Montaña de Colores ou Rainbow Mountain. Independente do nome para identificá-la, já adianto: uma belezura só!